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Os pássaros da fraqueza


« Nádegas portentosas… Não a desenhei muito bem no quadro, mas foi só para lhes dar uma ideia. É assim que se compõe uma Vênus pré-histórica. Isso não quer dizer, de modo algum, o que imaginam os paleontólogos, não quer dizer em absoluto que elas fossem assim. O representante da representação, para eles, era diferente do que é para nós. Não era um balão ou dois, nem tampouco a invocação de As mamas de Tirésias – Alçai vôo, pássaros da fraqueza… Para eles, o representante da representação seguramente era assim. Isso lhes prova que o representante da representação pode diferir de acordo com as eras. »  Lacan J., O Seminário, livro 16 : de um Outro ao outro, Rio de Janeiro, JZE, 2008, p. 222. 

Lacan desenha uma Vênus pré-histórica para nos dar uma ideia dela, isto é, uma impressão que escapa ao raciocínio, já que o objeto é irrepresentável. No alvorecer da sublimação: duzentos e quarenta e quatro tesouros do paleolítico, encontrados da Sibéria até o Atlântico, parecem reduzir a mulher a suas iscas. Nomeadas de Vênus, por analogia à deusa, sonha-se com ela segundo os cânones da beleza de uma época. Nomeação, índice do sonho do paleontólogo: Vênus impudica para a primeira descoberta, Vênus de Lespugue, Vênus de Moravany, Vênus de Willendorf … A Dama de Brassempouy é uma exceção, porque esta representação realista de rosto humano, a mais antiga, é sem boca e sem corpo! Mas, uma vez que os pássaros da fraqueza tenham voado, como saber se essa representação é homem ou mulher?